terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Pracinha de Lucena

Tiroteio, música brega, carro com som em volume estridente, brigas, cachaça e, dizem, até outras drogas mais fortes.

Essa é a Pracinha de Lucena, litoral paraibano, antigo refúgio da juventude para a paquera e o namoro ? Ou os incidentes são eventuais e alguém em pânico quer transformar em pesadelo o sossego dos moradores e visitantes ?

Ouvi um adulto, chefe de família, que conduzia esposa e filhos para a pracinha exclamar: aqui é o paraíso! Aqui, ele dizia, Lucena.

As férias em Lucena, incluindo os banhos em Pontinha, praia que tem formidável banco de areia, que permite as pessoas entrarem a pé mar a dentro, local cheio de piscinas; a areia de Camaçari, os passeios ao encontro dos rios Miriri e Bonsucesso com o mar, lá na Barra do Miriri onde a água permuta ora morna, ora fria. Na aventura da ida até as ruínas da Igreja do Bonsucesso lá nas alturas do "morro" do Bonsucesso onde, depois de atravessar dois leitos de maré abarrotados de crias de caranguejo, se tem esplendorosa vista do mar, dos rios, dos coqueiros e das praias. Agora com mais um atrativo, pelo menos para nós, o banho de "braço de mar" no Rio da Guia, próximo ao santuário de NSª. da Guia.

Todo esse luxo, esse esplendor natural, agora parece estar sacrificado. Alguns acham que ali está se instalando o reino do terror, da marginalidade, da bandidagem. Alguns roubos e até morte já aconteceram prá dar sustentação a uma certa paranóia.

Acho que há exagero. O mundo não se acabou. Lucena ainda tem salvação. É claro, ali hoje não há mais o sossego de 10 anos atrás quando se dormia com as portas abertas. Mas também definitivamente não se impõe o reino do medo. Há sinais, mas precisa sem pânico e até com alegria e criatividade conservar e desenvolver as raízes culturais de Lucena que permitia aquela gostosa vida pacata.

Lucena tem bons indicadores. Acredito no trabalho com a juventude iniciado, apenas iniciado, por um grupo denominado apôitcha! Em Lucena traços mais profundos de nossas origens resistem meio cambaleantes, mas resistem: ali existe os (ou as ?) Cambindas de Lucena grupo popular que preserva a dança de nossos ancestrais. PauloRó e Ernestina em surdina dão esteio prá cultura popular. Lucena é diferente.

A chegada da grande balsa tão esperada com os turistas, também desejados, não deve se transformar em símbolo definitivo da perdição. Claro há turistas da mau educação, da pura exploração, da ideia de "tirar vantagem", de quem só sobra lixo, mas há aqueles visitantes que são tratados no aconchego da população de Lucena com simpatia e carinho e estes indubitavelmente não irão trazer só entulho para essa terra e esse povo.

Povo de ar romântico que põe num empório comercial o lírico nome de Vólinda.

Enfim, você é daqueles que acha que tudo está perdido, que Lucena e sua pracinha se tornaram um inferno de alucinados, drogados, arruaceiros, bandoleiros e pistoleiros ou você acredita que as raízes culturais de Lucena são tão consolidadas que o lirismo, o romantismo, a solidariedade e a generosidade arrebentarão a maré da violência que, numa escala maior, varre o nosso país ?


* Lucena - pequena cidade do litoral paraibana, na outra margem do porto de Cabedelo. Pescadores e pequenos agricultores parecem fazer parte da maioria da população.


* Apôitcha - associação que contribui para a educação de crianças e jovens criada em Lucena há poucos anos e já premiada pela unesco. [ Pois está ! = apois,tá = apôitcha]

* Cambindas de Lucena - grupo de cultura popular que tem formato próprio, próximo ao reisado, tem lanceiros, baianas e outras figuras/funções. É composto apenas de homens e usam vestes aparentando vestido feminino.